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Cidades

24/03/2021 17:16

Número de jovens em UTIs choca médicos

Um plantão recente do médico Matheus Alves de Lima, que atende pacientes de Covid-19 em UTIs de dois hospitais de campanha no Distrito Federal e arredores, ilustra uma preocupante, mas ainda pouco compreendida mudança no perfil de pacientes graves do novo coronavírus em meio ao colapso dos sistemas de saúde do país.

"Tivemos a morte de um paciente de apenas 25 anos, o que é muito chocante", explica Alves.

"E outro paciente, de 28 anos, não resistiu a ser extubado (processo de retirada da ventilação mecânica), precisou ser intubado novamente e fazer hemodiálise. Se não fosse a Covid-19, ele provavelmente jamais precisaria fazer hemodiálise nessa idade. Nos dois últimos meses, temos visto cada vez mais pacientes entre 25 e 40 anos, o que assusta – são pacientes da minha idade. São jovens e já chegam graves, depois de ficar esperando por vagas (de UTI) em emergências lotadas. A gente intuba, intuba, e não acaba. Eles chegam precisando de diálise de urgência, às vezes em choque. Tudo isso piora muito seu prognóstico. Às vezes, chegam à UTI só para falecer."

Esse crescimento no número de pacientes mais jovens em situação grave graves foi comentado pelo secretário de Saúde do Estado de São Paulo, Jean Gorinchteyn, em uma entrevista coletiva em 1° de março.

"A pandemia retornou com uma velocidade e uma característica clínica diferentes daquela da primeira onda", afirmou Gorinchteyn.

"São pacientes mais jovens, que têm a sua condição clínica muito mais comprometida e, pior, são pacientes que acabam permanecendo um período mais prolongado nas UTIs. Na primeira onda, tínhamos (nas UTIs paulistas) percentual de mais de 80% de idosos e portadores de doenças crônicas. O que temos visto hoje são pacientes mais jovens, 60% deles de 30 a 50 anos, muitos dos quais sem qualquer doença prévia."

Com o organismo geralmente mais forte do que o de idosos, os mais jovens resistem melhor aos procedimentos que têm sido realizados nas Unidades de Terapia Intensiva, como ventilação mecânica e hemodiálise.

No entanto, como consequência, também acabam ocupando os leitos por muito mais tempo. Segundo Gorinchteyn, a média de ocupação de UTIs em São Paulo passou de 7 a 10 dias por paciente, para 14 a 17 dias "no mínimo".

"São as pessoas que se sentem à vontade para sair porque acham que (se pegarem Covid-19) só vão perder paladar e olfato, e acabam perdendo a vida", prosseguiu o secretário.

"Outro aspecto é a gravidade com que eles chegam. Sua oxigenação baixa sem que o indivíduo sinta (se não medir com um oxímetro) e, quando ele chega ao hospital, vê-se o quanto sua saturação (de oxigênio no sangue) está baixa e o quanto ele tem comprometimento de pulmão."

 

Embora a chegada de pacientes mais jovens com quadro mais graves seja perceptível, ela não é plenamente entendida, porque o Brasil não dispõe de dados oficiais consolidados de casos e internações de Covid-19 por faixa etária, explica Marcio Sommer Bittencourt, mestre em saúde pública e integrante do Centro de Pesquisa Clínica e Epidemiológica do Hospital Universitário da USP, em São Paulo.

Ele lista diversas causas que, somadas, provavelmente compõem o retrato atual.

A primeira é a mencionada por Gorinchteyn: como as populações mais novas – desde jovens adultos até 59 anos – resistem por mais tempo na UTI, a tendência é que aumente a ocupação de leitos por elas.

A segunda é o fato de a infecção por Covid-19 ter aumentado exponencialmente em todo o país nos últimos meses – o que levaria, portanto, a mais infecções entre mais jovens. A incógnita é se aumentou proporcionalmente mais entre eles, diz Bittencourt.

"Além disso, os mais jovens são mais economicamente ativos do que os idosos, então saem mais para trabalhar. Isso já acontecia antes (da segunda onda), mas agora (o efeito disso) é mais perceptível."

Por fim, existe o fato de estarmos diante de variantes mais infecciosas do coronavírus, que podem também estar aumentando a gravidade dos casos.

"Provavelmente são todas essas causas juntas, mas não sabemos qual delas impacta mais o momento atual", afirma Bittencourt. "O que se sabe com certeza é que as novas cepas em circulação aumentaram o número total de internações e de casos mais graves em geral."


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